segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Lei reconhece autista como deficiente e obriga escolas a oferecer vagas.

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Todo o cidadão brasileiro, seja ele deficiente ou não, possui diversos direitos, como ao acesso à saúde, cultura e, principalmente, à educação. Apesar disso, alguns preconceitos acabam fazendo com que os deficientes possam ficar impossibilitados de exercer esses direitos, portanto, para isso, foram criadas leis específicas para essas pessoas, como forma de garantir que a discriminação não as deixe ficar alheias à sociedade. Recentemente - no final de dezembro do ano passado -, o governo federal incluiu nesse grupo de deficientes os autistas, que antes eram considerados como "portadores" de um tipo de transtorno, fazendo com que eles não tivessem tantos direitos como os deficientes possuem. 


A lei 8.112 veio para mudar essa realidade e trouxe em seu texto algo que chama bastante a atenção, na área da educação, e que fará com que o sistema educacional se prepare ainda mais para lidar com essa situação, já que, a partir deste ano letivo de 2013, nenhuma escola pode negar uma vaga a pessoas com autismo. Em Sorocaba, as redes municipal, estadual e particular revelam que já oferecem vagas a esses alunos, tanto que só na rede pública, existe um total de 50 alunos autistas matriculados para o ano letivo de 2013. A rede particular não possui um levantamento dessa quantidade, conforme informações do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (SIEEESP) e do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino Básico de Sorocaba e Região (Sinepe). 
O presidente da Associação Amigos dos Autistas de Sorocaba (Amas), Celso Leuzinger Humaytá, que possui um filho autista de 25 anos, acha louvável essa atitude do governo federal, já que agora faz com que os autistas sejam ainda mais reconhecidos como cidadãos de direitos na sociedade. "A lei é bonita, mas para chegar nisso tudo aqui (o que prevê a lei), vai demorar. Se não tiver um trabalho especializado para ele (o autista), ele não convive socialmente e piora", opina. Para ele, toda lei, quando criada, é "bonita", o problema é fazer com que ela funcione realmente, em todos os aspectos a que ela se propõe. 
Para Humaytá, uma possível forma de fazer com que as escolas não só recebam os autistas, mas os recebam bem, de forma com que o sistema educacional adotado consiga realmente educar essas pessoas, seria uma melhor preparação por parte dos profissionais e também conhecimento da doença. "O autista é tão complicado, pois cada um é do seu jeito. Por isso, o professor precisa se capacitar para isso, com cursos, por exemplo, para se preparar para essa situação diferente", relata. "É difícil saber como trabalhar com eles. Não tem como colocar em uma sala de aula e achar que ele vai aprender e fazer tudo. É preciso ter um trabalho grande e específico para essa situação. Se aqui (na Amas) o autista faz tudo e chega em uma escola regular e não faz nada, então quer dizer que isso não funciona", considera. 
A coordenadora da Amas, Jeane Pereira de Lima Collaço, ressalta que o autista não tem iniciativa própria para fazer as atividades como os outros alunos, por isso seria difícil um professor conseguir dar a atenção necessária ao autista e a uma classe inteira, de 30 alunos por exemplo, ao mesmo tempo. "Ele não tem a iniciativa de fazer alguma coisa, ele faz por comando verbal. Se ninguém falar nada para ele fazer, ele pode ficar o dia todo sentado", afirma. E, para isso, Jeane destaca que existe na lei 8.112 uma saída para resolver essa situação, já que o parágrafo único do artigo 3º da legislação garante que, se necessário, o aluno autista incluído em classes comuns do ensino regular têm direito a um acompanhante especializado. "A lei veio para mostrar que vai melhorar a situação", diz a coordenadora. "Mas a lei tem que funcionar para isso acontecer", complementa Humaytá.
A lei
A lei 8.112, sancionada pela presidente Dilma Rousseff (PT) em 27 de dezembro de 2012, instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Já no parágrafo segundo do artigo 1º da lei, o texto demonstra que todo autista é considerado como deficiente, para todos os efeitos legais. Com isso, a legislação tem o intuito de garantir o direito dos autistas ao acesso à educação, à saúde e ao mercado de trabalho, assim como são os direitos de todos os cidadãos garantidos na Constituição Federal.
O que vem mais chamando a atenção seria a obrigatoriedade de todas as escolas oferecerem vagas para pessoas com autismo, inclusive determinando que o profissional que se negar a fazer a matrícula, poderá receber uma multa de três a vinte salários mínimos, que em reais daria entre R$ 2.024,85 e R$ 13.499. A legislação ainda informa que, para garantir que a matrícula desses alunos ocorra, o poder público poderá firmar parcerias com entidades, como a Amas, para garantir que nenhum autista fique sem o acesso à educação.
Por isso, o presidente e a coordenadora da Amas informam que a entidade está disponível às escolas e pais de autistas, para passarem mais informações a respeito da doença, como forma de garantir que o processo educacional seja feito da forma correta e apropriada a essas pessoas especiais. A Amas fica na rua Nova Odessa, 201, Jardim Vera Cruz, e o telefone de lá é (15) 3334-4400.
Estimulação e socialização foram determinantes para Melissa
A menina Melissa Vieira Garcia, de 7 anos, apesar de ser autista, não se difere da maioria das crianças. Ela canta, dança, pula, faz várias poses para as fotos e abraça, sem problemas, as visitas que recebe. E tudo foi conseguido, segundo sua mãe, a professora Gilsemara Costa Vieira Garcia, 48, por ela estar matriculada em escola pública desde que ela tinha 4 anos. "Ela estudava em escola particular, quando estava no maternal, mas depois ela foi para a CEI (Centro de Educação Infantil) e agora está numa escola estadual, a Arquimínio Marques da Silva", relata a professora. 
Segundo Gilsemara, a diferença entre a escola particular e pública é que na pública há uma socialização maior entre as crianças, já que ela acolhe alunos de diversas classes sociais e algumas vezes possuem mais crianças por sala de aula. "E o importante para o autista é a socialização", revela a mãe de Melissa. Ela relata que o atendimento prestado à sua filha na escola Arquimínio Marques da Silva atende completamente às necessidades de Melissa, contando com professores capacitados e que entendem bem como a menina deve ser escolarizada. "Muitas vezes as pessoas acham que os autistas não conseguem acompanhar o aprendizado, mas na verdade eles são muito inteligentes", diz a professora, afirmando que Melissa conseguiu aprender a falar em inglês por conta própria, "tudo pelo interesse dela", complementa. 
E essa inteligência da menina é nitidamente percebida, somente ao conversar alguns minutos com ela. Apesar de ter um problema na fala, que Gilsemara diz não ser característica do autismo, mas por ela ter começado a falar somente aos 4 anos, Melissa se expressa extremamente bem e em algumas vezes o repórter até pensou: "será que ela tem só 9 anos mesmo?" "Ela adora ler e lê de tudo, até os livros de química do irmão dela, que tem 17 anos. Na escola ela foge às vezes da sala de aula e vai direto para a biblioteca. A direção da escola até autorizou ela tomar o lanche na biblioteca, pois ela adorar ficar lá na hora do recreio", conta Gilsemara. Perguntada sobre o que ela mais gosta de ler, Melissa não hesitou em dizer que os gibis são os seus favoritos. "Eu estou fazendo as minhas próprias tirinhas (por meio de um programa disponível na Internet) e já fiz várias, mas ainda preciso editar algumas", relata Melissa. 
Gilsemara ressalta que, desde pequena, sua filha participa de diversas atividades pedagógicas além da escola, como teatro, dança, aulas de música, entre outras. "No autismo, se os pais não colocam os seus filhos em várias atividades, eles ficam estacionados. Se a Melissa está desse jeito hoje, é porque nós trabalhamos bastante com ela. No autismo existem 14 características que os definem, antes ela tinha 9 delas, hoje ela tem só 2", afirma. 
Atendimento nas redes de ensino
Segundo informações de representantes das redes de ensino municipal, estadual e particular de Sorocaba, o conceito de inclusão já é trabalhado em todas as escolas, portanto as determinações da Lei 8.112 já estão sendo seguidas na cidade. Conforme informações da Secretaria Municipal de Educação, em 2012 a rede municipal atendeu 26 alunos autistas. Já para 2013, existem 44 autistas matriculados. Na rede estadual, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo revela que, para 2013, um total de 6 alunos com autismo estão matriculados em Sorocaba.
De acordo com a Secretaria de Educação do município, o principal meio de subsidiar esse atendimento às crianças deficientes, inclusive os autistas, seria o Centro de Referência em Educação "Dom José Lambert", que tem como função apoiar as unidades escolares por meio de uma equipe multidisciplinar (professores, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, fisioterapeuta e fonoaudiólogos) tendo como finalidade o desenvolvimento e aprendizagem de todos os alunos.
A pasta revela que para atender os alunos autistas, existem 24 salas de recursos multifuncionais, as quais funcionam nas escolas, no contraturno, ou seja, as crianças frequentam o ensino regular e no outro período recebem o atendimento educacional especializado, quando as intervenções são feitas diretamente com o aluno por meio de diversos recursos, assim como, os seus familiares e a equipe escolar recebem as devidas orientações para que o processo pedagógico ocorra de forma satisfatória. 
A Secretaria de Educação do Estado informa que todas as escolas estaduais são inclusivas, como forma de atender os alunos com alguma deficiência, como os autistas. No caso dessa síndrome, a pasta informa que os que são de baixa complexidade, de acordo com análise médica e pedagógica, são matriculados no ensino regular e, se necessário, podem ser atendidos por professores especializados em deficiência intelectual no contraturno. Caso não seja possível o atendimento de um estudante na rede regular de ensino, devido ao elevado nível da deficiência, a pasta informa que ele é assistido por instituições de ensino credenciadas.
Sobre a rede particular, o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino Básico de Sorocaba e Região(Sinepe) e diretor regional do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (SIEEESP), Edgar Delbem, relata que todas as unidades trabalham com atendimento às crianças e adolescentes que possuem alguma deficiência. "As escolas normalmente recebem, em uma proporção não muito grande, as crianças que tem algum tipo de deficiência", afirma. 
A respeito dos autistas, ele ressalta que se trata de um caso mais específico, por isso ele acredita que os professores devem estar mais preparados para atender essa demanda. "Eu ainda não ouvi meus colegas mantenedores (sobre a Lei 8.112), mas com certeza vai ser assunto da nossa próxima reunião. O autista tem uma característica muito particular, pois tem uma deficiência persistente na comunicação. Então, vai ser um desafio enorme para educadores ativar essa comunicação, pois o conhecimento se desperta no calor da comunicação", argumenta.

FONTE: jornalcruzeiro.com.br

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